sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Espiritualidade no mundo do Trabalho – As 10 Razões

Posted by Atleta em Cristo On 07:05 No comments


A palavra espiritualidade pode suscitar muitas imagens: um mosteiro, com homens auto-flagelando-se em penitências; pessoas sentadas em roda, na posição de lótus, buscando fazer uma ponte entre seu eu mais profundo e as energias do universo; um auditório evangélico ou um palco com tele-evangelistas; uma romaria de fiéis que cruzam uma pequena vila, à luz de velas, seguindo um santo de devoção ao som de cantilenas tristes; ou até mesmo uma mesa cheia de cristais, gnomos, fitas e amuletos que visam a atrair os bons fluídos e afastar os maus olhados.
Todas estas, na verdade, são expressões de espiritualidade, cada uma delas empacotadas à critério de uma tradição religiosa. Cada civilização e cultura têm seus jeitos de sistematizar a experiência espiritual, estruturando as coisas em termos de dogmas, rituais e padrões morais. Mas isso é o que chamamos de religião. E o nosso assunto não é religião. É espiritualidade.
Mas, o que é espiritualidade? Há pelo menos seis respostas possíveis. Algumas pessoas acreditam que a espiritualidade está relacionada às dimensões do humano, como por exemplo, corporeidade e racionalidade. Assim como todos temos corpo e mente, temos também espírito, e tudo quanto está relacionado ao espírito está no campo da espiritualidade. Por essa razão, é comum que a espiritualidade diga respeito ao que é imaterial, intangível, isto é, aquela dimensão da existência humana que não é acessível por meio dos sentidos físicos. Isso explica também porque a espiritualidade está relacionada tanto aos atributos do espírito, como razão, emoção, volição, e principalmente,  consciência e auto-consciência, como também às virtudes do espírito, como justiça, compaixão e amor. Outra maneira de compreender a espiritualidade é associada à busca de sentido, em suas duas conotações: direção (o que orienta a vida), e significado (o que faz a vida valer a pena). Finalmente, há quem relacione a espiritualidade como a capacidade humana de se relacionar com o mundo dos espíritos, dos deuses, e em última instância, Deus.
A espiritualidade, portanto, é (1) a dimensão do humano, (2) própria da imaterialidade, relacionada aos (3) atributos e (4) virtudes do espírito, que busca (5) sentido da / na vida, inclusive por meio da relação com (6) os espíritos, os deuses, e Deus.
A espiritualidade está geralmente associada à interioridade humana, e remete às capacidades humanas mais subjetivas como criatividade, intuição e sensibilidades múltiplas, que nos capacitam a lidar com o belo, o justo e o bom.
O teólogo italiano Stefano de Fiores diz que “a civilização industrial não cumpriu suas promessas: em vez de oferecer um mundo segundo a medida do homem, em que este pudesse viver e morar procurando o bem comum trouxe-nos, entre outras coisas, o critério da produtividade como parâmetro de valor, a massificação e a manipulação das pessoas, uma angustiante incomunicabilidade, um futuro ameaçador, a atrofia dos sentimentos e a poluição ecológica”. Por esta razão, existe “a necessidade de oferecer ao mundo moderno um ‘suplemento de alma’ que permita ao homem evitar ser esmagado por suas próprias produções e encontrar a si mesmo de modo autêntico”.
Essa constatação acompanha as conclusões do economista brasileiro Eduardo Gianetti, em seu recomendável livro Felicidade, onde escreve que “o iluminismo propôs a relação entre o progresso do processo civilizatório e o aumento da felicidade humana”. Por “progresso no processo civilizatório”, entenda-se: “o avanço do saber científico; o domínio crescente da natureza pela tecnologia; o aumento exponencial da produtividade e da riqueza material; a emancipação das mentes após séculos de opressão religiosa, superstição e servilismo; a transformação das instituições políticas em bases racionais; e o aprimoramento intelectual e moral dos homens por meio da ação conjunta da educação e das leis”. Gianetti conclui em tom de desilusão, que “entre as crenças que povoavam a imaginação e a visão de futuro iluminista, uma em particular revelou-se problemática: a noção de que os avanços da ciência, da técnica e da razão teriam o dom não só de melhorar as condições objetivas de vida, mas atenderiam aos anseios de felicidade, bem estar subjetivo e realização existencial dos homens. Sob este aspecto, seria difícil sustentar que o presente esteja à altura do amanhã pretendido de ontem”.
Em outras palavras, o ser humano tem melhor domínio de todas as coisas, exceto sobre si mesmo. Tratar da espiritualidade é adentrar a este desconhecido mundo das subjetividades humanas, capaz de sabotar qualquer programa de qualidade e deixar todo mundo mais eficaz e ao mesmo tempo mais infeliz, o que cedo ou tarde explode em ineficácia com seus múltiplos e indescritíveis prejuízos. É por isso que a espiritualidade tem tudo a ver com o mundo do trabalho.
Tomo a liberdade de sugerir dez razões para você incluir a espiritualidade na pauta de discussão da sua vida profissional, sua empresa e seu jeito de trabalhar e fazer negócios.
1. Corpo sem alma é defunto, alma sem corpo é fantasma
Quem não tem uma visão integral da vida está atrasado. A empresa que encara seus funcionários apenas como mão de obra, e não como pessoas inteiras, está dessintonizada com seu tempo. A vida humana possui múltiplas dimensões: bio, psíquica, espiritual e social. Para que uma pessoa se entregue por inteiro, todo e qualquer envolvimento pessoal deve ser satisfatório para todas as dimensões do ser. O desenvolvimento espiritual possui um potencial integrador de todas as demandas pessoais, uma vez que promove um estado de espírito que funciona como patamar de sustentação de todas as áreas da vida.
2. Ninguém produz de cabeça quente
O pluralismo do mundo pós moderno, as incertezas sócio-econômicas, a competitividade do mercado são fatores que resultam em insegurança e geram níveis de stress e ansiedade que conspiram contra o melhor desempenho do ser humano em todas as áreas de sua vida, especialmente na sua atividade profissional. O brasileiro está entre os mais estressados do mundo, e o esgotamento associado ao trabalho atinge 30% da população. Sobrecarga de trabalho e medo do desemprego são as causas mais citadas entre aqueles que sofrem da síndrome de “burn out”, último nível de stress. O desenvolvimento espiritual, que às vezes é visto de forma primitiva, buscando nas divindades a bênção para a prosperidade, ou tido como muleta psíquica, pode ser também encarado como um caminho de desenvolvimento e transformação pessoal, que qualifica o ser humano integralmente para responder com êxito aos desafios do dia-a-dia.
3. Uma andorinha só não faz verão
O mundo perdeu suas noções hierárquicas e a liderança está esvaziada de sua autoridade imposta. Dizemos que quem tem chefe é índio, e a liderança hoje é compreendida como a arte de inspirar e influenciar pelo exemplo e o serviço. O sucesso coletivo depende de pessoas capazes de articular conexões e potencializar a cooperação. O profissional que não sabe trabalhar em equipe e não é capaz de desenvolver relacionamentos pessoais de qualidade acaba se tornando impedimento ao fluxo de riquezas de uma organização. As parcerias, por sua vez, dependem de outros fatores igualmente importantes e que lhe dão sustentação, como por exemplo, a auto-estima, a autoconfiança, a segurança. O desenvolvimento espiritual fornece os alicerces interiores que nos permitem abrir o coração para relacionamentos frutíferos.
4. A gente não quer só comida
Já não é de hoje que concordamos que o trabalho não pode ser alienado e alienante. Também não pode ser encarado apenas como fonte para a sobrevivência. Deve fonte de satisfação e realização pessoal, e acima de tudo oportunidade de contribuição social. Quando o ser humano é capaz de contribuir para o bem comum expressando o melhor de si mesmo, então as portas da realização se abrem. O trabalho passa a ser visto como prazer e responsabilidade que transcendem os compromissos formais com uma organização. Todos saem ganhando: a sociedade, que é servida por um profissional consciente de seu papel; a empresa, que é objeto da dedicação qualificada do profissional; e o próprio profissional, que tem prazer e se realiza no que faz. O desenvolvimento espiritual ajuda o ser humano a enxergar o significado permanente daquilo que é efêmero, e o valor extraordinário daquilo que é rotineiro.
5. Os buracos negros sugam energias
A qualidade do resultado de uma empresa está na proporção direta da qualidade de quem produz o resultado. Quem pode esperar qualidade de alguém que deixa o salário do mês no bar da esquina, possui uma família desestruturada, ou convive com uma angústia existencial que se expressa em forma de agressividade, apatia e insatisfação permanente? Todas as empresas deveriam instituir um programa de busca de “ISO Existencial” para seu quadro de cooperadores. O desenvolvimento espiritual ajuda a colocar a vida em ordem, de modo que o potencial produtivo de cada ser humano não seja roubado pela necessidade constante de solução de conflitos.
6. O que é certo dá certo
Um dos mais danosos sentimentos que o ser humano cultiva é a culpa. A consciência, ou a mera sensação de dívida, é um dreno psicoemocional. Quando os valores, posturas e procedimentos de uma empresa não estão alinhados com as convicções de seus funcionários, a empresa é composta por pessoas em conflito com suas próprias consciências, e que, portanto, se doam com reservas. Quando o profissional não é capaz de enquadrar sua atividade em uma moldura que satisfaz seus valores mais profundos, a empresa passa a ser vista como mal necessário, e até mesmo como adversária à sua qualidade de vida. O desenvolvimento espiritual proporciona a unidade de crenças e valores em uma empresa. Como resultado, surge um horizonte comum de procedimentos que permite a soma dos esforços e o espírito de cooperação sem que nenhuma das partes se sinta lesada ou violentada no processo.
7. Um por todos e todos por um
As organizações da sociedade já não se compreendem como únicas e suficientes na formação e cuidado do ser humano. A cooperatividade entre escola e família, igreja e Estado, empresas e ongs, enfim, das diversas instituições dentro das quais o ser humano interage é fundamental para o desenvolvimento e enriquecimento pessoal. Independentemente dos benefícios que uma empresa pode colher em razão de considerar o ser humano em suas múltiplas relações, existe o fato de que o respeito às liberdades e consciências individuais é uma das características do que chamamos mundo civilizado. Tratar o ser humano integralmente é um fim em si mesmo. Respeitá-lo em suas opções existenciais e trabalhar por uma sociedade inclusiva é uma responsabilidade de qualquer organização com um mínimo de dignidade. O desenvolvimento espiritual não é um compartimento estanque da vida humana, mas afeta a integralidade de suas relações. A empresa que reconhece isso cumpre seu papel na formação do homem e da sociedade.
8. Por fora bela viola
Estudos recentes mostram a preocupação do público em estabelecer relações com empresas conscientes de suas responsabilidades éticas, ecológicas, e sociais. Não são poucos os que preferem ganhar um salário menor trabalhando em uma empresa compatível com suas crenças e valores. Muitas pessoas preferem comprar uma marca associada às questões que transcendem os interesses puramente comerciais e econômicos. O desenvolvimento espiritual é a plataforma por meio da qual a empresa alinha sua realidade operacional com os valores do novo mundo em que vivemos. De fato, a integração entre discurso e prática é o alicerce do sucesso duradouro. A coerência, mais que a perfeição, é o que se cobra de quem pretende ser gente do bem.
9. Muito mais que lucros
Na conta das riquezas existenciais, o dinheiro está entre as menores. Somente os tolos ainda não perceberam que o essencial da vida não tem preço e não se compra. A verdadeira riqueza consiste em promover o crescimento simultâneo de todas as contas correntes, sem transferir fundos de umas para as outras. Quando alguém saca da conta caráter para depositar na conta financeira, ou saca da conta saúde para depositar na conta carreira, ou da conta família para depositar na conta prazer, está fazendo um jogo que quase sempre acaba em falência sistêmica. O desenvolvimento espiritual oferece discernimento, sabedoria, e libera as fontes do enriquecimento pleno.
10. Outro mundo é possível
Fazemos parte de uma aldeia global. Nossos horizontes de ambição não se esgotam em pessoas equilibradas, famílias saudáveis, empresas prósperas ou uma sociedade justa. Queremos um mundo novo. E muito embora saibamos que nada se compara à plenitude universal, que geralmente chamamos de paraíso / céu, vivemos sob o imperativo de manifestar aqui e agora o máximo possível deste mundo em plenitude. O desenvolvimento espiritual é a porta de acesso não apenas à transformação pessoal, mas para a revolução mundial. Tal ambição não é mero otimismo ou pretensão quixotesca, mas apenas a vazão do clamor das entranhas de todo ser humano que já despertou. Nós humanos somos nostálgicos da utopia.
O Fórum Cristão de Profissionais existe para levantar a bandeira da espiritualidade no mundo do trabalho. Aí estão algumas suficientes razões para que você carregue também essa bandeira.
© Ed René Kivitz

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